Mesmo antes do julgamento dos embargos de declaração no Supremo Tribunal Federal (STF), a defesa de Jair Bolsonaro se movimenta para afastar o risco de o ex-presidente cumprir no Complexo Penitenciário da Papuda a pena de 27 anos e três meses por golpe de Estado.
A Primeira Turma do STF inicia nesta sexta-feira (7) no plenário virtual a análise dos recursos de Bolsonaro e de outros seis réus do chamado "núcleo crucial" da trama golpista. A expectativa é de rejeição dos embargos, abrindo caminho para o relator, ministro Alexandre de Moraes, determinar o início da execução da pena.
Diante desse cenário, a defesa solicitou à equipe médica que cuida de Bolsonaro a elaboração de relatórios e laudos com seu histórico de saúde. A ideia é usar os documentos para embasar futuramente o pedido de prisão domiciliar e tentar convencer Moraes a afastar o "risco Papuda".
A equipe, que inclui cirurgião, clínico-geral e dermatologista, prepara uma cronologia da saúde do ex-presidente desde a facada durante as eleições de 2018 até hoje.
Amparada nas manifestações dos médicos, a defesa deve apontar riscos à saúde em razão de câncer de pele e crises de refluxo, soluço e vômito, além de pressão alta e apneia, somados às complicações derivadas das sucessivas operações na região do abdômen após a facada de 2018.
Em abril deste ano, Bolsonaro passou no Hospital DF Star, em Brasília, por uma "laparotomia exploradora", voltada à desobstrução do intestino e reconstrução da parede abdominal. Foi a sétima cirurgia dele por consequências do atentado.
"Acho que o castigo e a tortura que o Alexandre de Moraes está submetendo o Bolsonaro tem que ter algum limite", afirmou o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). "O mínimo que pode ser feito é fazer com que ele fique em casa, tratando da sua saúde."
Os laudos, porém, não serão apresentados de imediato. A estratégia é entregar a documentação ao final de todas as etapas, junto com o pedido para que Bolsonaro seja mantido em prisão domiciliar.
A iminência da prisão do ex-presidente e a possibilidade de ele ser obrigado a cumprir a pena na Papuda causam preocupação no governo do Distrito Federal.
Autoridades da cúpula do Palácio do Buriti têm procurado reservadamente integrantes do STF para expor receios sobre um eventual encarceramento de Bolsonaro na Papuda.
Nesta semana, o secretário de Administração Penitenciária do Distrito Federal, Wenderson Souza e Teles, pediu a Moraes que o ex-presidente seja submetido a avaliação por equipe médica especializada, para "avaliação de seu quadro clínico e a sua compatibilidade com a assistência médica e nutricional disponibilizados nos estabelecimentos prisionais" da capital federal.
No entorno de Bolsonaro, avalia-se que o pedido do secretário escancarou o incômodo do Palácio do Buriti e abriu nova frente de pressão para que Moraes não o envie a uma prisão comum. O governador Ibaneis Rocha (MDB) pretende disputar o Senado no ano que vem, com apoio do clã Bolsonaro e do eleitorado de direita.
"Se Bolsonaro passar mal e morrer lá na Papuda, o governo do DF vai ficar péssimo na foto. Ele também gera enorme instabilidade no sistema prisional. Toda a segurança deve ser reforçada para evitar rebelião, que seria provável. E é chato para um candidato que quer o eleitorado de direita", afirma um interlocutor de Bolsonaro que pediu para não ser identificado.
A chefe de gabinete de Moraes visitou a Papuda para conferir as instalações e analisar o melhor local para receber o ex-presidente; apurou-se que a visita ocorreu no final de outubro.
No entorno de Bolsonaro, a expectativa é de que ele seja enviado à Papuda para cumprir o início da pena, mas depois obtenha prisão domiciliar, amparado em argumentos médicos e no precedente de outro ex-presidente, Fernando Collor.
Collor foi condenado em 2023 pelo STF a 8 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro por desvios na BR Distribuidora, em caso da Lava-Jato, mas conseguiu prisão domiciliar ao alegar doenças graves, como doença de Parkinson e transtorno bipolar.
Para o advogado Paulo Amador Bueno, que atua na defesa de Bolsonaro, uma eventual ida do ex-presidente à Papuda seria "mais uma violação a direitos humanos fundamentais".
"Seria uma medida bastante diferente da aplicada recentemente ao presidente Collor, mantido em prisão domiciliar por conta de apneia do sono. A situação do presidente Bolsonaro é extremamente delicada. Para além das sequelas decorrentes da facada, hoje apresenta câncer de pele", afirmou.
