Yifat Tomer-Yerushalmi, principal autoridade jurídica das Forças de Defesa de Israel (FDI), foi presa por indisciplina após vazar um vídeo de maus-tratos a um prisioneiro palestino. Para parte da sociedade, é heroína; para outra, traidora. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, criminoso e oportunista, chamou o vazamento de "o mais grave ataque" à imagem de Israel.

Independentemente do rótulo, a general de duas estrelas é acusada de condutas incompatíveis com qualquer instituição militar: indisciplina, tramoia política, divulgação de informações sigilosas e acobertamento.

As FDI deveriam pairar acima da política, mas Israel vive desafios enormes. "Todo mundo" sabe que a Força Aérea e o Mossad são vistos como de esquerda, ainda que cumpram ordens de qualquer governo. O Exército, com raízes igualitárias, ficou mais à direita na era Netanyahu, e forças de operações especiais têm bolsões antiesquerdistas.

Após a ativa, generais costumam entrar na política ou migrar para o lucrativo setor de programas digitais de segurança. Yitzhak Rabin, assassinado há 30 anos, foi general de linha dura e, com esse cacife, bancou os Acordos de Oslo. Era de esquerda, do Partido Trabalhista.

O vídeo vazado há um ano e cinco meses por Tomer-Yerushalmi mostra um prisioneiro palestino retirado de um grupo com vendas nos olhos e deitado de bruços no chão, no centro de detenção de Sde Teiman, ativado durante a guerra em Gaza.

Levado a um canto, ele é cercado por soldados com escudos usados em confrontos de rua e agredido. Em certo momento, parece que um objeto é introduzido em seu ânus; depois, o detento foi atendido com ruptura retal e costelas fraturadas. Identificado como integrante do grupo terrorista Hamas, não teve o nome revelado e foi libertado em troca de prisioneiros.

Cinco reservistas estão sendo julgados, mas a suposta armação da chefe da advocacia militar, se confirmada, prejudicou o caso. Quando foram presos, manifestantes de direita invadiram o quartel onde estavam, sob o argumento de que soldados davam a vida para sufocar o Hamas após a invasão terrorista de 7 de outubro de 2023, que matou 1,2 mil pessoas.

A ultradireita passou a acusar a chefe jurídica de traição, e o vazamento, com cenas reeditadas, produziu uma impressão mais prejudicial aos acusados do que o que teria ocorrido. O julgamento, que deveria esclarecer os fatos, foi sabotado pelas atitudes da general.

Manter a disciplina e coibir abusos é vital para qualquer força armada que não queira desmoralizar a si mesma. Em Israel, os comandos tiveram de intervir até para frear vídeos imprudentes de reservistas nas redes sociais, que viraram acusações de crimes de guerra em países onde organizações favoráveis ao Hamas são fortes.

Adversários de Israel exploram o caso para desmoralizar o país e as FDI. A gravidade do ocorrido precisa ser apurada e punida pelo bem da nação. A advogada-geral e o procurador-geral das FDI, tenente-coronel Matan Solomosh, preso por envolvimento no vazamento, só ampliaram o escândalo.

Tomer-Yerushalmi disse ter vazado o vídeo em defesa própria, após ser acusada de atos antipatrióticos. Militantes de esquerda chegaram a anunciar sua "morte" durante horas em que seu paradeiro era desconhecido. O ministro da Defesa, Israel Katz, declarou: "qualquer pessoa que levante calúnias contra soldados israelenses não merece usar a farda das FDI".

Quem pratica maus-tratos gravíssimos e quem sabota a disciplina militar deve ser punido, sem contaminação política. No contexto da guerra, os ataques do grupo terrorista Hamas e os ataques terroristas de Israel precisam ser repudiados; o desafio do país é fazer justiça em ambos os lados, algo cada vez mais difícil.