Belém se torna o epicentro das negociações climáticas até 21 de novembro. Pela primeira vez na Amazônia, a COP30 quer recolocar a emergência climática no centro das prioridades globais, com decisões concretas sobre adaptação, transição energética e dinheiro novo para viabilizar as mudanças.
Delegações de 194 países e da União Europeia participam. A expectativa é de mais de 50 mil pessoas na capital paraense, entre negociadores, cientistas, sociedade civil e movimentos sociais.
Anfitrião, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva atua para construir consenso e acelerar ações que evitem um mundo permanentemente 1,5ºC mais quente. Sob sua liderança, o Brasil busca unir países em torno de resultados práticos e financiados.
"A COP30 é a COP da verdade", destacou o líder brasileiro, que reafirmou, em diferentes momentos, a urgência da necessidade de financiamento para adaptação e transição energética, de se afastar de forma planejada e acelerada da dependência dos combustíveis fósseis.
"A cúpula de líderes foi bastante positiva porque tocou num ponto que é fundamental, quando a gente discute clima, que é o fim do uso de combustíveis fósseis. O presidente Lula disse que quer ver, no fim da conferência, os países acordando um mapa do caminho, uma espécie de roteiro de como a gente vai fazer a transição, porque ela não vai acontecer da noite para o dia. Como essa transição vai acontecer? Quais países começam primeiro? Qual é a linha de tempo disso, o tamanho do esforço, quanto de financiamento? Esse recado foi fundamental", afirma à Agência Brasil o secretário executivo da Observatório do Clima, Márcio Astrini.
Os combustíveis fósseis, como petróleo e carvão, respondem por cerca de 75% das emissões globais. Agricultura, resíduos, processos industriais e mudanças no uso da terra completam o quadro de fontes de aquecimento do planeta.
Mesmo assim, a urgência climática enfrenta um cenário difícil, com conflitos armados, o histórico recente de negacionismo e um repique de emissões no ano passado, puxado pelo CO2.
Menos de 80 países atualizaram suas NDCs, metas que orientam a redução de emissões. As promessas publicadas cobrem 64% das emissões globais, mas uma parcela significativa dos grandes emissores ainda não apresentou novos compromissos.
"A gente não sabe o que os países prometeram fazer, porque eles não entregaram essas promessas. Então, você esperava que eles apresentassem ali durante a cúpula, pelo menos alguns deles, mas as promessas não vieram e isso daí foi um lado muito ruim", critica Márcio Astrini.
Em carta recente, a presidência da COP30 pediu que Belém marque "um ciclo de ação" e convoque união e cooperação para enfrentar a crise climática.
O processo negociador é por consenso entre 198 partes, o que torna tudo mais complexo. A preparação incluiu rodadas como a Conferência de Bonn e a Pré-COP em Brasília, para tentar alinhar posições.
Três eixos guiam as conversas: adaptação climática, transição justa e a implementação do Balanço Global do Acordo de Paris.
Adaptação significa preparar cidades e territórios para eventos extremos, com definição de indicadores do Objetivo Geral de Adaptação que permitam medir o progresso.
A transição justa deve ganhar um programa de trabalho com diretrizes para proteger quem será impactado pela descarbonização, somando-se à transição energética e criando novas oportunidades de emprego.
Também está na pauta a execução do primeiro Balanço Global, concluído na COP28, que trouxe recomendações para acelerar o combate ao aquecimento.
O maior gargalo, porém, é o dinheiro. Sem financiamento, a virada para uma economia de baixo carbono não sai do papel, alertam negociadores e especialistas.
"Os países ricos, há muito tempo, prometeram que iriam colocar dinheiro em cima da mesa. Eles são os que mais devem dentro dessa conta do clima e prometeram financiar uma saída para que os países pudessem ali se desenvolver, sem perder sua economia, sem gerar pobreza, implementando novas tecnologias. Só que o dinheiro prometido para fazer essa transição nunca apareceu, na verdade. E isso gerou uma crise de confiança, que piorou na última conferência do clima [a COP29, em Baku, no Azerbaijão]".
Para responder a isso, foi apresentado o "Mapa do Caminho de Baku a Belém", com a meta de viabilizar US$ 1,3 trilhão por ano em financiamento climático.
Na agenda brasileira, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre promete mais de US$ 5,5 bilhões para proteger florestas em cerca de 70 países, com pelo menos 20% dos recursos destinados a povos indígenas e comunidades tradicionais.
Fora da área oficial de negociações, a participação social promete ser marcante. A Zona Verde, espaço público e gratuito, deve concentrar debates e soluções em tecnologia, inovação e justiça climática.
Administrado pelo governo federal, o espaço reúne sociedade civil, instituições, comunidades tradicionais e juventudes. A mobilização indígena prevista é a maior da história das COPs, com mais de 3 mil pessoas.
"Clima não é conversa de ambientalista ou de diplomata. Clima tem a ver com o nosso dia a dia - quando sobe o preço do café, por exemplo, é porque a safra, o plantio, teve prejuízo no Brasil, na Indonésia, no Vietnã, por questões climáticas. Quando a gente tem a tarifa vermelha [na conta de luz], é porque não choveu direito no local certo, as hidrelétricas não foram abastecidas, a energia ficou mais cara. Clima é uma coisa que tem a ver com o nosso prato de comida, com o nosso dia a dia", diz Márcio Astrini, ao celebrar a ampla participação social prevista nesta COP.
"Essa já é a COP vitoriosa, porque o fato de ser realizada no Brasil movimentou diversos setores, muitos deles que nunca tinham conversado, se aproximado da agenda de clima, pessoal da religiosidade, do movimento negro, nós tivemos juízes, a área da saúde, da educação, são muitos movimentos que foram ficando mais próximos, mais íntimos do problema, se apropriando mais da agenda do clima".
A Cúpula dos Povos, autônoma, começa na Universidade Federal do Pará, com barqueata no Rio Guamá e delegações de mais de 62 países. Uma grande marcha está prevista para sábado.
"Em todas as COPs, saíram acordos que não foram cumpridos na sua totalidade. O que precisamos é que esses acordos firmados, de fato, sejam efetivados e cumpridos. E chamar quem de fato lida com a proteção territorial, a preservação e a conservação para a mesa de negociação. De igual para igual", afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

