Às vésperas do início oficial da COP30, o presidente da conferência climática da ONU, André Corrêa do Lago, afirmou que a própria existência do encontro em Belém é uma resposta direta ao negacionismo e ao boicote de Trump ao Acordo de Paris. Para ele, a agenda do clima mostrou resiliência em um ano de pressões e segue viva no multilateralismo.
Pela primeira vez, a cúpula de líderes ocorreu antes da abertura formal da COP. Em Belém, a presença de delegações foi expressiva. "A grande presença de delegações em Belém foi algo muito positivo e altamente simbólico."
Segundo o embaixador, a mobilização tem peso especial após as "bordoadas" que a agenda sofreu desde a eleição de Donald Trump, marcada pela retirada dos EUA do Acordo de Paris. Mesmo assim, o encontro manteve o foco em avançar.
Um dos destaques foi o lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), concebido para valorizar florestas tropicais a partir da Amazônia, com caráter prático e de implementação. "Sem a menor dúvida, o lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) foi central."
Mais de 50 países já declararam apoio político ao TFFF, embora menos de dez tenham anunciado aportes financeiros até agora. Corrêa do Lago reforçou que não há frustração com o ritmo. "Não estou nem um pouco decepcionado. Ao contrário: penso que foi um grande sucesso. A sinalização foi muito clara. O fundo é inovador, e muitos países ainda têm que fazer discussões internas para confirmar a entrada."
Questionado sobre o novo ciclo de negacionismo e a decisão de Trump de retirar novamente os EUA do pacto climático, ele foi direto: "O próprio fato de a COP acontecer já é uma grande reação. Até o momento, não há nenhuma indicação de outro país que vá sair do Acordo de Paris. Algo que, aliás, também não ocorreu da outra vez (no primeiro governo de Trump). Realizar a COP é uma maneira de dizer que o mundo ainda acredita que a melhor maneira de lidar com o tema do clima é através do multilateralismo, mesmo que os EUA tenham uma opinião diferente."
Sobre a ausência do governo americano na conferência, o embaixador avaliou: "Ignorar a COP é, de certa forma, uma confirmação da decisão de sair do Acordo. Uma coisa é os Estados Unidos ficarem em um organismo internacional e lutarem pelas suas posições. Se eles já anunciaram que vão sair do acordo, o mais lógico é não participar."
A ida de prefeitos e governadores democratas dos EUA foi vista como um sinal de ação concreta no nível local. "Se só estivéssemos pensando na negociação do clima, não teria, porque prefeitos e governadores não podem negociar em nome de seus países. No entanto, cidades e estados podem implementar (políticas climáticas). Então a presença deles fortalece a ideia de que será uma COP da implementação."
Apesar de um número de chefes de Estado aquém do desejado e da ausência de líderes dos Brics, Corrêa do Lago rejeitou a ideia de esvaziamento. "Não acho, em absoluto, que tenha sido uma cúpula esvaziada. Ela teve muito impacto."
Para além das negociações, ele ressaltou que a conferência precisa entregar para públicos distintos. "A COP precisa produzir resultados diferentes para públicos diferentes. Os negociadores pensam que a COP é só deles, mas a conferência tem outras tarefas, como convencer o grande público de que está na hora da implementação. Precisamos reconquistar a confiança da sociedade civil nessa agenda. Por causa da COP, as pessoas estão falando de clima."
A pauta de eliminação de combustíveis fósseis não está mandatada na agenda oficial, mas domina as conversas, com protagonismo do Brasil. "O presidente Lula está muito convencido de que algo terá que ser dito na COP sobre os combustíveis fósseis. Ele falou no tema duas vezes na cúpula de líderes, em um tom que impressionou. Não está mandatado (na pauta oficial da conferência), mas alguma coisa pode sair."
Com Lula defendendo um recado firme sobre fósseis e Belém no centro das atenções, a expectativa é de uma COP focada em resultados práticos e na virada para a implementação.

